segunda-feira, 28 de novembro de 2011

VÁCUO...

À grande mulher e atriz Fernanda Montenegro

VÁCUO...
intelectual e moral
predomina em nossa sociedade
sociedade dita contemporânea...
TROTSKISMO VOYEURISTA!
Qu´est-ce que c´est?
Je ne sai pas...
Ricos e famosos?
Despossuídos e anônimos?
a comunhão com o belo pode alimentar a alegria ou confortar a dor de uma perda
A arte conforta
O palco é o espaço mais libertário que existe na Terra.
Ali não se pode ter medo do que é humano.
É na arte que o homem se ultrapassa definitivamente.
VIVER SEM TEMPOS MORTOS...
VIVER SEM TEMPOS...
VIVER SEM...
VIVER...
...
..
.

Marcos Peter Pinheiro Eça

Abraço afetuoso a todos,
Marcos.
 

sexta-feira, 25 de novembro de 2011

RENASCIMENTO DO PODER TRANSFORMADOR

RENASCIMENTO DO PODER TRANSFORMADOR

Fazer sempre as escolhas
que forem mais bonitas
pra vocês.
A vida é muito curta
pra ser desperdiçada.
Somente a arte salva!
Sem a arte não há salvamento!
Enter the Void
Drugstore Cowboy
My Own Private Idaho
Elefante
Últimos dias
Paranoid Park
Restless...
Sem descanso...
Cansaço... Balaço... Tropeço...
Jogados ao léu novamente.
Mente... Mente... Mente...

Marcos Peter Pinheiro Eça

Abraço afetivo a todos,
Marcos.

quinta-feira, 24 de novembro de 2011

A VIDA SEM ARTE FICA VAZIA

A VIDA SEM ARTE FICA VAZIA

VIDA SEM ARTE FICA VAZIA
VAZIA: FICA VIDA SEM ARTE
ARTE NA VIDA
CASCA DA VIDA
VIDA SEM CASCA
IDENTIDADES?
VALORES?
EU NÃO SOU O QUE EU TENHO!
EU SOU O QUE EU SOU!
EU SOU O QUE EU PENSO!
REMAR CONTRA A MARÉ?
QUIÇÁS...
TALVEZ...
POSSIVELMENTE...
PROVAVELMENTE...
LÍQUIDO?
FLUIDO?
FUGAZ?
TEMPOS LÍQUIDOS?
TEMPOS FLUIDOS?
TEMPOS FUGAZES?
ILUSÕES...
CONSTRUÇÕES...
REPRESENTAÇÕES...
JOGADOS AO LÉU...
ABONDONADOS...
VIOLENTADOS...
ESTUPRADOS...
ARREGAÇADOS...
ARROMBADOS...
DILACERADOS...
OH... DEUS, POR QUE NOS ABANDONASTE?
SE É QUE NOS ABANDONASTE...
SOMENTE A ARTE...
A ARTE SOMENTE...
VAZIA A VIDA; A VIDA SEM ARTE.
ARTE NA VIDA; VIDA NA ARTE
ARTE PARA A VIDA; VIDA PARA A ARTE
ARTE COM A VIDA; VIDA COM A ARTE
ARTE PELA VIDA; VIDA PELA ARTE
ARTE ATRAVÉS DA VIDA; VIDA ATRAVÉS DA ARTE
ARTE;
TEAR;
ETAR;
ATER;
RETA...
NÃO! RETA... NÃO!
ARTE... ARTE... ARTE...
A VIDA SEM ARTE FICA VAZIA...
VAZIA: A VIDA SEM ARTE FICA.
ARTE...
ART...
AR...
A...
...
..
.

Marcos Peter Pinheiro Eça, novembro de 2011.

A HORA DOS CALHORDAS POR KENNETH MAXWELL

Meu querido amigo Luís Henrique enviou-me a seguinte notícia e parece-me pertinente compartilha-la com os que acompanham/leem meu blog:

A hora dos calhordas - Kenneth Maxwell

Discorrendo sobre suas experiências durante a histeria anticomunista do começo dos anos 50 nos EUA, a escritora Lillian Hellman descreveu o período como "a hora dos calhordas". A definição se aplica com igual precisão à atmosfera do Reino Unido no período, quando Alan Turing, um dos mais brilhantes cientistas do século 20, matou-se em 1954, aos 41 anos.

Turing era homossexual. Foi condenado sob a Criminal Amendment Act, uma lei de 1885 que permitia processos contra homens envolvidos em atos homossexuais realizados em espaços públicos ou privados. Foi essa a lei sob a qual Oscar Wilde foi condenado em 1895. Em 1952, 1,6 mil homens foram acusados de crimes sob essa legislação homófoba.

Alan Turing, professor na Universidade de Manchester, foi prestar queixa à polícia sobre o roubo do relógio. Admitiu aos policiais que tinha relacionamentos homossexuais. Foi-lhe oferecida uma escolha entre prisão ou castração química. Escolheu a segunda.

Em 2009, o então primeiro-ministro Gordon Brown apresentou desculpas públicas pelo tratamento do governo britânico a Turing. "Lamentamos muito", disse Brown. "Você merecia muito mais."

De fato, merecia. Em função da lei dos segredos oficiais, Turing não teve reconhecimento público por sua contribuição fundamental à vitória aliada na Segunda Guerra Mundial.

Ele liderava uma equipe em Bletchley Park, o sigiloso centro britânico de decodificação, e criou a máquina eletromecânica usada para determinar a posição dos rotores dos codificadores mecânicos alemães conhecidos como Enigma. Isso permitia que os britânicos lessem os códigos alemães.

Mas a elite britânica abandonou Turing quando ele foi acusado de "obscenidade grave". O matemático recebia injeções semanais do hormônio feminino estrógeno, para suprimir seus desejos homossexuais, e isso causou definhamento de seus testículos e o surgimento de seios. Ironicamente, essas grotescas injeções ocorreram menos de dez anos depois da queda do regime nazista, sob o qual médicos conduziam experiências de utilidade igualmente dúbia contra vítimas indefesas.

Turing foi um estudante excêntrico em Cambridge e Princeton. Em 1946, desenvolveu a ideia de um sistema automatizado de computação, o primeiro projeto de um computador moderno. Em 1952, publicou um estudo sobre a morfogênese, processo biológico que determina a distribuição espacial de células durante o desenvolvimento embriônico de um organismo, trabalho essencial para a descoberta do DNA. Ele foi um dos pensadores mais originais do século 20.

Mas sua história também revela as consequências trágicas do preconceito cego.

Tradução de PAULO MIGLIACCI

Kenneth Maxwell é historiador britânico graduado em Cambridge (Reino Unido) com doutorado em Princeton (EUA). Uma das maiores referências na historiografia sobre o período colonial brasileiro, é diretor do programa de Estudos Brasileiros na Universidade Harvard (EUA).

 http://www1.folha.uol.com.br/colunas/kennethmaxwell/1011155-a-hora-dos-calhordas.shtml  acesso em 24/11/2011.

Grande abraço a todos,
Marcos.

quarta-feira, 23 de novembro de 2011

INTERLOCUÇÃO(ÇÕES)

Poema: Interlocução(ções)

Thomas Kyd disse:
                              onde as palavras não prevalecem,
                              a violência prevalece.
Marcos Eça disse:
                             a violência prevalece,
                             onde as palavras não prevalecem.
Thomas Kyd disse:
                               onde as palavras não prevalecem,
                               a violência prevalece.
Marcos Eça disse:
                             prevalece a violência,
                             onde não prevalecem as palavras.
Thomas Kyd disse:
                             onde as palavras não prevalecem,
                             a violência prevalece.
Marcos Eça disse:
                             prevalece, envaidece, entorpece A VIOLÊNCIA
                             onde prevalecem não as palavras.
Marcos disse:
                     falemos, digamos, sintamos: apenas sejamos mais humanos...
                     Violência?
                     Sangue?
                     Por que somos tão violentados, dilacerados e estuprados todos os dias?
                     Haverá saída?
                     Recorro ao mestre Drummond: E agora José? E agora José? E agora José?
                     ...
                        ...
                           ...

Marcos Peter Pinheiro Eça em novembro de 2011.
Abraço afetivo e humano a todos,
Marcos.

terça-feira, 22 de novembro de 2011

CÓPIA FIEL DE ABBAS KIAROSTAMI

Eita fiRRRme bom do cacete, rs...

"A qualidade de uma obra de arte está nos olhos de quem vê. Portanto, uma falsificação bem feita teria a mesma validade de um original, já que seu impacto no observador, caso ele não saiba que se trata de uma falsificação, será o mesmo".

Em Cópia Fiel, o cineasta iraniano Abbas Kiarostami oferece um cardápio estimulante: ao mesmo tempo em que constrói uma história de amor, induz o telespectador a raciocinar sobre a falsidade de tudo que nos rodeia, inclusive das relações.

Em: O Estado de São Paulo, 20 a 26 de novembro de 2011, TV, p.13.

http://youtu.be/eqjYRDXPNPE










Abraço afetuoso a todos,
Marcos.

MY DAUGHTER HAS CHOSEN THE DARK SIDE

O que é "the dark side"? Não será apenas divertir-se? Por que devemos sempre julgar?
PORRA DE JULGAMENTOS!!!

http://youtu.be/WFrX92ngPCU

Have a good time!!!

Abraço carpedieminiano a todos,
Marcos.

A dança dos esqueletos

Essas são ótimas!!!

http://youtu.be/bfev28iA-cA

http://youtu.be/sAEeaZF6cZQ

http://youtu.be/5-405Vvn3OU

http://youtu.be/Xvy3qrHjCVA

Abraço caveriano a todos,
Marcos.

AI WEIWEI




Abraço a todos,
Marcos.

Preciosidades & barbaridades - HUMBERTO WERNECK


Preciosidades & Barbaridades de Humberto Werneck


Bolar um bom título, capaz de fisgar o leitor e docemente obrigá-lo a ler a matéria, costuma ser um tormento para jornalistas. A isso se deve, aliás, parte dos cabelos brancos na cabeça do sujeito que se vê na foto acima. Colecionar títulos, porém, pode ser um prazer, e, para quem é obrigado a fazê-los, um consolo.

No ofício há um bocado de tempo, vi engordar uma coleção formada por preciosidades e por barbaridades (nenhuma delas, vou avisando, de minha autoria). Quanto a estas, meu colega e amigo Carlos Brickmann bem podia reunir em livro as antipérolas que há anos vem publicando em sua coluna semanal no site Observatório da Imprensa.

Eu poderia falar de títulos felizes - como este de Guilherme Cunha Pinto no Jornal da Tarde: 'Morreu Picasso - se é que Picasso morre'. Ou aquele outro, de Marco Antônio Lopes na Playboy, para uma reportagem sobre atores de filmes pornô: 'Gente que faz'. Ou, ainda, o de Fernando Paiva, incumbido, na redação da Elle, de botar título num artigo sobre o palpitante tema da... farinha de trigo. Eu estava lá e vi nascer a preciosidade: 'A jóia do trigo'.

Mais alguns? Vamos lá. No Jornal da Tarde dos primeiros tempos, em reportagem sobre se ainda havia quem acreditasse no chamado Bom Velhinho, o afiado redator Carmo Chagas cravou esta maravilha: 'Papai Noel existe. Está até morrendo.' Na IstoÉ, nos anos 80, um disco supostamente repetitivo foi avaliado como 'Déjà-Lee'. 'Cuidado, tinta fresca', advertiu Cassiano Elek Machado no topo de reportagem da Piauí sobre falsificação de quadros a óleo. Em 1970, no primeiro número da inesquecível Bondinho, revista recheada de estimulantes ousadias jornalísticas e comportamentais, um título conseguiu descrever a sensação vertiginosa de escorregar num brinquedo que era então novidade: 'Tobogã, lá vou eu sem mim'. No dia em que a seleção brasileira enfrentaria em casa um adversário vindo do outro lado do mundo, o Correio Braziliense recomendou: 'Abre o olho, japonês!' Ante a inesperada derrota, foi preciso ajoelhar no milho na edição seguinte: 'Japonês abriu o olho'.

A lista de bons títulos, benza Deus, é extensa - mas desconfio de que você gostaria mais de visitar a outra ala da coleção, a das barbaridades. Inclui clássicos manjados como 'Cachorro fez mal à moça', sobre a senhorita que baixou no hospital depois de comer um cachorro-quente vencido, ou 'Violada no auditório', sobre a célebre noite de 1967 em que, num festival de música, Sérgio Ricardo arremessou o violão na plateia que o vaiava.

Feliz ou infelizmente, há muito mais nessa divertida galeria de horrores jornalísticos. Me lembro de ter lido na capa de um suplemento agrícola: 'O porco, esse desconhecido'. Como não li a matéria, pois o título já me bastou, nosso irmão suíno continua a ser, para mim, um enigma que grunhe.

Na minha adolescência belorizontina, saiu notícia num jornal de Minas sobre a doença que mataria um dos maiores romancistas brasileiros. O título, em uma coluna, empilhava cinco palavras, e uma delas, por acidente ou dolo, mudou de lugar, daí resultando um desastre que, de quebra, lançou dúvida sobre a natureza da enfermidade: 'José Lins enfermo do Rego'. O mesmo jornal, anos mais tarde, ao informar sobre o estado de saúde do homem forte da então Iugoslávia, saiu-se com esta: 'Morte de Tito é questão de tempo'.

'Quando menos se espera, chega o Natal', anunciou um jornal de que já não me lembro. Numa chamada de capa sobre Caetano Veloso e o carnaval, o redator da revista Visão Espírita não teve dúvida: 'Atrás do trio elétrico também vai quem já 'morreu''. No alto de uma entrevista com a escritora lésbica Cassandra Rios, por muito tempo vítima da censura, a revista TPM lascou: 'A perseguida'. Nos anos 90, a imprensa de São Paulo serviu ao leitor bizarrias como 'Fala entre sexos é dificultada pelo cérebro'; 'Sanguessuga cruza em hipopótamo'; 'Sexo reduz expectativa de vida de verme'; 'Pássaro tem pênis falso e é o único a ter orgasmo'.

Minha barbaridade predileta, porém, foi obra do falecido Notícias Populares, por ocasião do acidente em que Nelson Piquet teve um pé esmagado. Para reconstituí-lo, os médicos usaram tecido retirado das nádegas do piloto. Você adivinhou: 'Piquet dá a bunda para não perder o pé'.

Em: O Estado de São Paulo, domingo, 20 de novembro de 2011, Cidades/Metrópole, C12

Enorme abraço a todos,
Marcos.

DA INTELIGÊNCIA CANINA

Essa eu devo a minha amiga Magda. Obrigadérrimo!!! 

Da inteligência canina

Quando o cão elabora um plano complexo
RESUMO Um fait-divers recentemente publicado na imprensa italiana, sobre um cão que dá prova de sagacidade numa situação de grave perigo para sua dona, suscita reflexões sobre a inteligência dos cachorros, assinalada por autores da Antiguidade clássica, como Plutarco, Plínio e outros.

UMBERTO ECO
tradução MAURÍCIO SANTANA DIAS
UMA SENHORA que estava catando cogumelos com uma amiga é picada por uma vespa, tem um choque anafilático, para de respirar, a amiga telefona para a emergência, mas o socorro demora a chegar porque as duas mulheres estão em um bosque muito cerrado e é difícil localizá-las.
Então Queen, o cachorro (mas imagino que fosse uma cadela) da amiga, em vez de ficar ali, como o instinto recomendaria, ganindo e lambendo a mão da moribunda, parte feito um raio, atravessa o bosque, encontra a equipe de resgate e a conduz até o lugar certo.
Como Danilo Mainardi comenta no "Corriere della Sera" de 21 de agosto, não estamos diante de um simples comportamento instintivo: estamos diante de um comportamento "inteligente", em que o cão não responde ao comando do instinto (não se afastar do ferido), mas elabora "um plano complexo, que abrange até a coparticipação de outros indivíduos".
RACIOCÍNIO O caso -e os comentários de Mainardi- evocam uma literatura antiquíssima e vasta sobre as capacidades de raciocínio dos cães. Um dos textos que mais influenciaram essa tradição é a "História Natural" (77 d.C.) de Plínio, que trata da fala dos peixes e dos pássaros e discorre amplamente sobre a inteligência canina, cita um cachorro que reconhecera entre a multidão o assassino de seu dono e, com seus latidos e mordidas, o forçou a confessar o crime, ou ainda o cachorro de um condenado à morte que uivava dolorosamente e, quando um espectador lhe jogou uma comida, ele a levou até a boca do morto; quando o cadáver foi atirado no Tibre, ele também se jogou e nadou, tentando sustentá-lo.
Mas a discussão filosoficamente mais interessante já tinha ocorrido pelo menos três séculos antes, em um debate entre estoicos, acadêmicos e epicuristas. No âmbito da discussão estoica desponta um argumento atribuído a Crisipo, que será retomado e popularizado quase cinco séculos depois por Sexto Empírico.
Sexto considerava que os cães fossem capazes de raciocínio lógico, e a prova disso era que um cão, após chegar a um trívio e reconhecer pelo faro que a presa não tinha seguido por duas das estradas, imediatamente envereda pela terceira sem nem farejar. Com efeito, o cão teria formulado de algum modo o seguinte raciocínio: "A presa seguiu por esta estrada, ou por essa, ou por aquela; ora, a estrada não é esta nem essa; então só pode ser aquela" (o que seria um exemplo de raciocínio conhecido como "quinto indemonstrável").
Além disso, Sexto lembrava que os cães possuem um "logos" porque sabem arrancar espinhos do corpo e limpar as feridas, porque mantêm imóvel a pata doente e identificam as plantas que podem aliviar a dor.
Quanto a uma linguagem animal, é verdade que não compreendemos os sons emitidos por eles, mas tampouco entendemos os sons emitidos por bárbaros, os quais no entanto falam; e os cães certamente emitem sons diversos em situações diferentes.
PLUTARCO Poderíamos continuar citando o "De Sollertia Animalium" (sobre a astúcia dos animais), de Plutarco, no qual se diz que, de fato, a racionalidade animal é imperfeita se comparada à humana, mas que essas diferenças também ocorrem entre seres humanos; e em outro diálogo, "Bruta Animalia Ratione Uti" (os animais usam a razão), a quem contestasse que seria demasiado atribuir a razão a seres que não têm uma noção inata da divindade, Plutarco responderia recordando que entre os seres humanos também existem os ateus.
Em "A Natureza dos Animais", de Eliano, além dos argumentos já vistos, são citados exemplos de cães que se apaixonam por seres humanos. No "De Abstinentia" (da abstinência), de Porfírio, os argumentos em favor da inteligência animal servem para sustentar uma tese "vegetariana". Todos esses temas serão retomados de várias maneiras na era moderna, até nossos dias.
Mas paremos por aqui: ainda que não se consiga definir bem a inteligência canina, deveríamos ser mais sensíveis a esse mistério. E, se for muito difícil virar vegetariano, pelo menos que donos menos inteligentes que eles não abandonem seus cães nas estradas.



Cães possuem um "logos" porque sabem arrancar espinhos do corpo e limpar feridas, porque mantêm imóvel a pata doente e identificam plantas que podem aliviar a dor Plutarco diz que, de fato, a racionalidade animal é imperfeita se comparada à humana, mas que essas diferenças também ocorrem entre os próprios seres humanos

Em: O Estado de São Paulo, domingo, 09 de outubro de 2011, Ilustríssima, 6.

Abraço canino a todos, rs...
Marcos.

EINSTEIN ERROU?

Einstein errou?

Muitos sonham em desmentir o genial físico alemão; por enquanto, porém, suas teorias, que inspiraram tecnologias como laser e GPS , resistem ao teste do tempo

MARCELO GLEISER
COLUNISTA DA FOLHA

Esta semana marcou o 106º aniversário da publicação do artigo de Einstein com a famosa fórmula E=mc2, talvez a mais famosa da física.
Aos 26 anos, Einstein redefiniu nossa compreensão da matéria, mostrando sua íntima relação com a energia. O elo da correspondência é a velocidade da luz, representada pelo "c", com um valor aproximado de 300 mil km/s.
Você pisca o olho e a luz dá sete voltas e meia em torno da Terra. Segundo a teoria da relatividade, nada na natureza pode viajar mais rápido do que a luz: qualquer objeto com massa, de um elétron a um cometa, necessariamente deve viajar com uma velocidade mais baixa do que "c".
Porém, vimos recentemente cientistas dos laboratórios europeus Cern, em Genebra, na Suíça, e Gran Sasso, na Itália, anunciando a detecção de partículas com velocidades maiores que a da luz.

FANTASMAGÓRICAS
As partículas são neutrinos, conhecidas como "partículas-fantasmas" devido à sua fraca interação com a matéria: neutrinos atravessam paredes, pessoas e planetas como se não existissem, apenas raramente colidindo com outras partículas.
Os experimentos começam criando neutrinos no Cern. Depois, eles viajam 730 quilômetros através da crosta terrestre até chegar aos detectores em Gran Sasso.
Embora o porta-voz da experiência tenha afirmado que o processo é simples, que basta dividir distância por tempo para obter a velocidade, na prática a coisa é bem mais complicada. De fato, a maioria absoluta dos físicos vê os resultados com muito ceticismo, duvidando que sobrevivam por muito tempo.
Ou, claro, pode ser que os neutrinos tenham viajado mesmo algumas dezenas de bilionésimos de segundo mais rápido do que as partículas da luz. Mas eu não apostaria nisso.
O que acho interessante é o burburinho que surge cada vez que um cientista crê demonstrar que Einstein errou.
Cientistas têm o dever de testar teorias. Dada a profundidade das teorias de Einstein, achar uma falha numa delas pode revolucionar a nossa compreensão do mundo natural. Esse tipo de ceticismo é vital para o funcionamento da ciência.

MATURAÇÃO LENTA
Muitas vezes, uma teoria demora a maturar. De volta a Einstein, esse foi o caso com a sua teoria da relatividade geral, a que relaciona a atração gravitacional com a curvatura do espaço.
A teoria foi desenvolvida aos poucos, entre 1907 e 1915, até Einstein chegar à sua versão final. Afirmar que Einstein deu passos "errados" no meio do caminho é ignorar o processo criativo dos cientistas; a ciência não anda numa linha reta entre dois pontos. Ela meandra aqui e ali até chegar ao seu objetivo.
Que eu saiba, os resultados principais de Einstein estão todos ainda conosco e continuam a inspirar novas pesquisas, sem falar nas tecnologias "einstenianas" do cotidiano.
Mesmo que, um dia, algumas das ideias de Einstein sejam suplantadas por novas teorias-e isso deve acontecer -, dizer que ele estava errado é no mínimo ingênuo.
Será que podemos dizer que Newton estava errado quando Einstein corrigiu suas teorias? Certamente não! Toda teoria deve ser aplicada dentro do seu limite de validade: julgá-la errada quando aplicada fora desses limites é não saber como usá-la.
O próprio Einstein considerou uma de suas ideias como o "maior dos seus erros", a adição da chamada constante cosmológica às equações descrevendo a geometria do Universo.
Em 1931, Einstein visitou o astrônomo Edwin Hubble no observatório do monte Wilson, na Califórnia, e teve a oportunidade de ver o desvio para o vermelho da luz emitida por galáxias distantes. A interpretação mais imediata desse desvio é a expansão do Universo, isto é, que as galáxias estão se afastando umas das outras a altas velocidades. Em 1917, Einstein havia escrito um artigo onde supõe que o Universo é estático, sem expansão alguma.
Para isso, teve de adicionar a constante cosmológica, que garante a solução estática que queria. O resultado de Hubble mostrou que sua suposição não era necessária.

REVIRAVOLTA
Ironicamente, em 1998, astrônomos descobriram que o Universo está em expansão acelerada, efeito que pode ser causado justamente pela constante cosmológica de Einstein. A natureza tem razões que a razão desconhece.
Outro "erro" de Einstein é sua posição com relação à mecânica quântica, que descreve as partículas da matéria. Ele nunca aceitou que, conforme dizia essa área da física, a realidade tivesse um forte componente aleatório.
Até hoje, nada de anormal foi encontrado com a mecânica quântica. Em defesa de Einstein, não houve aqui um erro, mas uma diferença filosófica na sua visão de mundo. É prematuro julgar se sua posição está certa ou errada.
A lição aqui me parece simples: é bom termos cuidado ao julgar teorias a partir de resultados recentes e com pouco escrutínio. Afirmações extraordinárias requerem provas extraordinárias.
Embora o questionamento constante seja vital para a ciência avance, as trombetas da revolução só devem ser soadas após a revolução ter mesmo começado.

MARCELO GLEISER é professor de física teórica no Dartmouth College, em Hanover (EUA), e autor de "Criação Imperfeita".
Em: A folha de São Paulo, domingo, 02 de outubro de 2011, C13. 
Abraço a todos,
Marcos.

Hércules demitido dos 12 trabalhos

Crônica correta e divertidinha do Marcelo Rubens Paiva.

Hércules demitido dos 12 trabalhos

Twitter ou Face? No primeiro, são 140 caracteres para um haicai romântico, piada de um tiro ou uma indignação a desconhecidos, que logo somem na misteriosa neblina da rede.

No segundo, você se sente no dever de expor a amigos e amigos de amigos que é esperto, antenado, engajado, que sabe garimpar músicas e vídeos, como se para eles fosse importante, naquele momento do dia, escutar e ver um clipe sugerido.
E, pior, fica tudo registrado para sempre. Na sua página, na dos outros, no Google, entre o céu e a Terra e sabe mais em que conglomerado.
Postei este raciocínio no Twitter. Foi um sucesso. Seguidores retuitaram. Tuiteiro ama o Twitter. É empolgado, como aquelas pessoas que falam sem parar, entendem de muitos assuntos e conseguem se meter em todas as rodas, sem receio de dar um fora. Parece fim de casamento, em que estão todos íntimos e altos.
Postei a mesma ideia no Face. Não curtiram. Faceiro é mais blasé. É seletivo. Escolhe com quem quer compartilhar suas informações. É ligado numa tal "privacidade", habilidade do milênio passado.
O comentário que faz sucesso numa rede social não é unanimidade na outra. O que indica que são próprias, seguem regras e condutas que não são necessariamente comuns. Como diria Tim Maia: "Uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra."
Na verdade, acho Twitter mais divertido. A rapidez faz com que o laptop ganhe o sentido literal, "computador de colo". E virou uma maneira de assistir à TV com a sala cheia de amigos, já que se comentam os lances do jogo, da novela, dos programas, até partidários, em comunidade.
Internautas espalhados pelo mundo ironizam ou se chocam concomitantemente. Certa vez, a calça de Zeca Camargo, apresentador do Fantástico, foi discutida mundialmente.
#Foi Wanda! virou top trend mundial. Tuiteiros de todas as partes, que acompanhavam os acontecimentos na Síria e Líbia, ficaram sabendo que no Brasil foi Wanda quem matou Norma, revelação do último capítulo de Insensato Coração.
Neal Gabler defende que vivemos cada vez mais num mundo "pós-ideia": se a informação foi um dia alimento de ideias, na última década ela se tornou sua concorrente.
"Somos inundados por tanta informação que não teríamos tempo para processá-la mesmo se quiséssemos."
Informações triviais expulsam informações significativas e ideias. Preferimos conhecer a pensar. Conhecer tem mais valor imediato. Ideias são pouco práticas. Dão muito trabalho, para pouca recompensa. É mais cômodo trocar informações, que se obtêm facilmente, do que ideias. E nem sempre essas informações resultam em ideias. Muitas delas serão esquecidas no dia seguinte.
Mas há um paradoxo. O próprio Face é uma tremenda ideia lucrativa e global. Como o Twitter. Não vão durar para sempre. A história da internet, ainda no seu limiar, prova que em poucos anos uma novidade substitui e aposenta uma ideia antiga.
A rede se devora de tempos em tempos. O novo se torna velho enquanto ainda engatinha. Pode ser a era do fim das ideias. Mas o consumo de novas ideias é a essência da rede. Que faz da sua renovação um vício.
+++
Por vezes, do nada, uma onda de inteligência e humor aparece no Twitter. Prova que, atrás dos digitadores de 140 caracteres, tem gente que sabe das coisas.
A crise da Grécia gerou diversos comentários. Afinal, não deixa de ser uma ironia o berço da civilização ocidental ser responsável pela possível quebradeira de um sistema aparentemente invencível, sólido e "justo".
De repente, apareceu o tópico #crisenagréciaantiga. Heróis mitológicos se viram diante de uma recessão iminente e da ironia dos mortais. Surgiram frases como:
"Medusa transforma pessoas em pedra e vai vender na cracolândia."
"Rei Minos autoriza venda de Minotauro para churrasco grego."
"Zeus anuncia demissão em massa no Olimpo para cortar gastos públicos."
"Vinte homens fogem de caverna e acusam Platão de sequestro."
"Sem dinheiro para pagar uma diarista, Zeus muda o nome do seu lar de Olimpo para Onãoreparaabagunça."
"Sem grana, Apolo tenta virar um colírio da Capricho."
"Atenas entra em liquidação e muda seu nome para Apenas."
"Hércules suspende seus 12 trabalhos por falta de pagamento."
"Hércules é demitido dos seus 12 trabalhos."
"Heráclito recicla água do rio."
"Zeus tenta reduzir a pensão das centenas de filhos na Justiça, alegando redução de ganhos."
"Hércules agora fará 16 trabalhos; os quatro a mais serão um extra para pagar dívidas."
"Ilha de Lesbos abre resort hétero."
"Sem dinheiro para pagar as dívidas, Zeus libera as ninfas para trabalharem na Eurozona."
"Escândalo: Priapo é visto comprando Viagra."
"Com aluguel atrasado, Platão é despejado de sua caverna. 'Crise não é um mito', admite."
"Vênus de Milo promete dar uma mãozinha a desempregados."
"'Ícaro está de dar pena...', revela Dédalo."
"Dionísio reclama de vinho ter sido substituído por pinga barata a fim de conter gastos."
"Centauro reclama da retirada do item ferradura da cesta básica como forma de corte de gastos."
"Projeto Todonon sofre cortes e vira Partenon."
"Alexandre, ricaço da Macedônia, está comprando tudo a preço de azeite."
"Com Sísifo em greve, pedra chega ao 5.° dia parada no pé da montanha."
"Sem recursos, governo admite adiar Olimpíadas para a Era Moderna."
"Parlamento grego convoca Hércules para executar trabalhos de ajuste fiscal."
"Prometeu rouba fogo para vender espetinho."
"'Se ao menos tivéssemos patenteado a democracia', lamentam gregos."
"Sem perspectiva de emprego, homens abandonam Ilha de Lesbos."
"Zeus tem raio desligado por não pagar conta de luz."
"Teseu é capa da G Magazine em novembro."
"Sísifo já não empurra mais uma pedra; fumou na cracolândia."
"Titãs em fúria fogem da ilha e formam uma banda de rock no Brasil."
"Zeus começa a demitir alguns deuses por falta de orçamento."
"Igreja Universal compra teatros gregos e deixa Dionísio enfurecido."
"Sem dinheiro para pagar plano, Édipo entra na fila do SUS para tratar do seu complexo."
"Poseidon começa a cobrar impostos sobre os habitantes que moram debaixo d'água."
"Eurípides abandona as tragédias e entra no mercado de musicais."
"Sófocles e Ésquilo estreiam próxima novela das 6."
Difícil dar crédito para os autores dessa zoação mitológica. Bem, as últimas duas são minhas. E se preparem para a #crisenaromaantiga. Império daqueles bêbados degenerados, pervertidos e sanguinários.

http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,hercules-demitido-dos-12-trabalhos-,800302,0.htm acesso em 22/11/2011.

Abraço a todos,
Marcos

segunda-feira, 21 de novembro de 2011

KIRSTEN DUNST

Eita minina BUNITA do caraiiiooo, rs...










Dá-lhe Kirsten e von Trier,,, genialidade das boas,,,

Abraço afetivo a todos,
Marcos.

domingo, 20 de novembro de 2011

MENSAGEM DE UMA ESCOLA DA CALIFÓRNIA

Minha amiga Vânia enviou-me a mensagem abaixo. Apesar de ser um texto de corrente, vale a pena reproduzi-lo...

MENSAGEM DE UMA ESCOLA DA CALIFÓRNIA
Esta é a mensagem que os professores de uma escola da Califórnia decidiram gravar na secretária eletrônica.
A escola cobra responsabilidade dos alunos e dos pais perante as faltas e trabalhos de casa e, por isso, ela e os professores estão sendo processados por pais que querem que seus filhos sejam aprovados mesmo com muitas faltas e sem fazer os trabalhos escolares.
Eis a mensagem gravada:
- Olá!    Para que possamos ajudá-lo, por favor, ouça todas as opções:
- Para mentir sobre o motivo das faltas do seu filho - tecle 1.
- Para dar uma desculpa por seu filho não ter feito o trabalho de casa - tecle 2.
- Para se queixar sobre o que nós fazemos - tecle 3.
- Para insultar os professores - tecle 4.
- Para saber por que não foi informado sobre o que consta no boletim do seu filho ou em diversos   documentos que lhe enviamos - tecle 5.
- Se quiser que criemos o seu filho - tecle 6.
- Se quiser agarrar, esbofetear ou agredir alguém - tecle 7.
- Para pedir um professor novo pela terceira vez este ano - tecle 8.
- Para se queixar do transporte escolar - tecle 9.
- Para se queixar da alimentação fornecida pela escola - tecle 0.
- Mas se você já compreendeu que este é um mundo real e que seu filho deve ser responsabilizado pelo próprio comportamento, pelo seu trabalho na aula, pelas tarefas de casa, e que a culpa da falta de esforço do seu filho não é culpa do professor, desligue e tenha um bom dia!"

Abraço dominical a todos,
Marcos.

quinta-feira, 17 de novembro de 2011

A BENETTON É FILHA DA PUTÉRRIMA...

A BENETTON - MARCA QUE EU GOSTO/ADMIRO/USO - É PHODONA MESMO...
DEBOCHE DOS BONS... EU se DIVIRTO, rs...

Merkel e Sarkozy



Obama e Chávez



Hu Jintao e Obama



Mahmoud Abas e Benjamin Netanyahu



Papa Bento XVI e Ahmed Mohamed el-Tayeb



Apesar de não ser Benetton Authentic, it´s a fake Benetton, vale a pena...

Dilma e Lupi

 

Eu SE divirto,

Abraço a todos,
Marcos.

MARIA BETHÂNIA...

Lindo, incrível, genial, sensível... contemporâneo!!!

Fera Ferida

http://youtu.be/JqeUWFvO9N8

Eu sei que vou te amar

http://youtu.be/YJNFzzUI7Wg

Eu preciso de você

http://youtu.be/G5G6Uu66yTQ

Desabafo

http://youtu.be/eIRNes-B3q0

Abraço afetuoso a vocês,
Marcos.

ÓPERA: VALQUÍRIA, WAGNER Á BRASILEIRA

Meu querido Luís Henrique apresentou-me/aproximou-me da ópera alemã. Muitíssimo obrigado, Luís.

'A Valquíria' de Wagner volta ao palco do Teatro Municipal após 50 anos

O retorno da obra, após tanto tempo, fez da produção a mais aguardada da temporada lírica deste ano

JOÃO LUIZ SAMPAIO
Quando o deus Wotan e a valquíria Brunhilde subirem hoje ao palco do Teatro Municipal de São Paulo, não estarão rodeados pela paisagem rochosa que antecede a entrada no Valhalla, a casa dos deuses da mitologia nórdica. Vão se deparar com cenários que evocam uma sala de ex-votos de Aparecida do Norte, no interior de São Paulo - apenas um aspecto do diálogo entre a mitologia e a cultura brasileira que está no centro da concepção da montagem de A Valquíria, ópera de Richard Wagner, que estreia hoje.

Encenada pela última vez em São Paulo nos anos 50 (e, antes disso, nos anos 20), A Valquíria é a segunda parte da tetralogia O Anel do Nibelungo, estreada por Wagner em 1876. O retorno da obra, após tanto tempo, fez da produção a mais aguardada da temporada lírica deste ano. E a expectativa não para por aí: estaríamos diante do primeiro passo de uma montagem completa do Anel, inédita em São Paulo?

Responsável pela regência do espetáculo, o maestro Luiz Fernando Malheiro, diretor do Festival Amazonas de Ópera, no qual produziu o Anel entre 2002 e 2005, é cauteloso. "Sou um maestro convidado no Municipal e não é meu papel discutir a programação", diz. Ele se confessa, no entanto, feliz de poder voltar à obra - e ajuda a explicar a sua importância. "A questão é que, quando falamos em Wagner, especialmente no caso do Anel ou de Tristão e Isolda, estamos tratando de obras que foram importantes não apenas para a história do gênero e da música como um todo, mas também para todas as áreas da criação artística, que de alguma forma dialogam até hoje com conceitos instituídos por Wagner, como o de obra de arte total", diz ele, no intervalo do ensaio realizado na tarde de domingo.

O diretor cênico André Heller-Lopes concorda - e nos últimos meses estruturou sua produção em torno do diálogo possível do universo wagneriano com a cultura brasileira. Wagner, diz, com o Anel, participou ativamente do processo de formação da cultura alemã. No fim do século 19, no Brasil, se falava da criação de uma Ópera Nacional, em consonância com o momento de discussão do que seria a cultura brasileira. "Estamos acostumados a tratar como brasileiro apenas aquilo que é folclórico, mas isso é redutor. Nós somos africanos, folclóricos, imigrantes, religiosos. E é a convivência da diferença que cria o momento especial que o País vive. Na nossa vida cultural, cabem diversas manifestações - e a ópera é uma delas."

A Valquíria narra a história do deus Wotan que, na busca por um mundo baseado no amor, corrompe-se e é confrontado com sua própria falibilidade. "O que a ópera aborda, fundamentalmente, são as relações humanas, a relação do homem com Deus, do homem com o poder. Na saga da queda dos deuses, do surgimento de uma nova raça livre, está também a discussão da nossa identidade cultural. O grande desafio é unir esse conceito moderno com o tradicional, o clássico que é minha formação como diretor especializado em ópera", diz o diretor. "E quando nos damos conta de que estamos no mesmo palco que, em 1922, abrigou a Semana de Arte Moderna, que também discutiu à sua maneira a identidade nacional, o conceito se fechou na minha mente."

O elenco da produção reúne cantores brasileiros e estrangeiros. A soprano escocesa Lee Bisset divide com a brasileira Eiko Senda o papel de Sieglinde; o tenor gaúcho Martin Mühle será Siegmund e a meio-soprano paulista Denise de Freitas, Fricka; o baixo americano Gregory Reinhart interpreta Hunding; Brunhilde será vivida pela também americana Janice Baird e o alemão Stefan Heidemann canta o papel de Wotan. Mônica Martins, Maíra Lautert, Keila de Moraes, Laura Aimbiré , Veruschka Mainhard, Lídia Schäffer, Adriana Clis e Elayne Casehr interpretam as oito valquírias, reponsáveis pela famosa Cavalgada.

A VALQUÍRIATeatro Municipal. Praça Ramos de Azevedo, s/nº. Hoje, 2ª, 4ª e 6ª (dia 15), às 19 h; sáb.,às 18 h. R$ 15 / R$ 70. Até 25/11

http://m.estadao.com.br/noticias/impresso,valquiria-wagner-a-brasileira,799447.htm acesso em 17/11/2011.

http://youtu.be/j8bO_O4agTE

Abraço wagneriano a todos,
Marcos.

quarta-feira, 16 de novembro de 2011

O CONTO DA ILHA DESCONHECIDA DE JOSÉ SARAMAGO

Minha queridíssima amiga Magda emprestou-me o livro "O conto da ilha desconhecida"... como, pra mim, foi uma experiência singular, gostaria de compartilhá-la com as pessoas que acompanham meu blog.

 O conto da ilha desconhecida
José Saramago




Um homem foi bater à porta do rei e disse-lhe, Dá-me um barco. A casa do rei tinha muitas mais portas, mas aquela era a das petições. Como o rei passava todo o tempo sentado à porta dos obséquios (entenda-se, os obséquios que lhe faziam a ele), de cada vez que ouvia alguém a chamar à porta das petições fingia-se desentendido, e só quando o ressoar contínuo da aldraba de bronze se tornava, mais do que notório, escandaloso, tirando o sossego à vizinhança (as pessoas começavam a murmurar, Que rei temos nós, que não atende), é que dava ordem ao primeiro-secretário para ir saber o que queria o impetrante, que não havia maneira de se calar. Então, o primeiro-secretário chamava o segundo-secretário, este chamava o terceiro, que mandava o primeiro-ajudante, que por sua vez mandava o segundo, e assim por aí fora até chegar à mulher da limpeza, a qual, não tendo ninguém em quem mandar, entreabria a porta das petições e perguntava pela frincha, Que é que tu queres. O suplicante dizia ao que vinha, isto é, pedia o que tinha a pedir, depois instalava-se a um canto da porta, à espera de que o requerimento fizesse, de um em um, o caminho ao contrário, até chegar ao rei. Ocupado como sempre estava com os obséquios, o rei demorava a resposta, e já não era pequeno sinal de atenção ao bem-estar e felicidade do seu povo quando resolvia pedir um parecer fundamentado por escrito ao primeiro-secretário, o qual, escusado se ria dizer, passava a encomenda ao segundo-secretário, este ao terceiro, sucessivamente, até chegar outra vez à mulher da limpeza, que despachava sim ou não conforme estivesse de maré.

Contudo, no caso do homem que queria um barco, as coisas não se passaram bem assim. Quando a mulher da limpeza lhe perguntou pela nesga da porta, Que é que tu queres, o homem, em lugar de pedir, como era o costume de todos, um título, uma condecoração, ou simplesmente dinheiro, respondeu, Quero falar ao rei, Já sabes que o rei não pode vir, está na porta dos obséquios, respondeu a mulher, Pois então vai lá dizer-lhe que não saio daqui até que ele venha, pessoalmente, saber o que quero, rematou o homem, e deitou-se ao comprido no limiar, tapando-se com a manta por causa do frio. Entrar e sair, só por cima dele. Ora, isto era um enorme problema, se tivermos em consideração que, de acordo com a pragmática das portas, ali só se podia atender um suplicante de cada vez, donde resultava que, enquanto houvesse alguém à espera de resposta, nenhuma outra pessoa se poderia aproximar a fim de expor as suas necessidades ou as suas ambições. À primeira vista, quem ficava a ganhar com este artigo do regulamento era o rei, dado que, sendo menos numerosa a gente que o vinha incomodar com lamúrias, mais tempo ele passava a ter, e mais descanso, para receber, contemplar e guardar os obséquios. À segunda vista, porém, o rei perdia, e muito, porque os protestos públicos, ao notar-se que a resposta estava a tardar mais do que o justo, faziam aumentar gravemente o descontentamento social, o que, por seu turno, ia ter imediatas e negativas consequências no afluxo de obséquios. No caso que estamos narrando, o resultado da ponderação entre os benefícios e os prejuízos foi ter ido o rei, ao cabo de três dias, e em real pessoa, à porta das petições, para saber o que queria o intrometido que se havia negado a encaminhar o requerimento pelas competentes vias burocráticas. Abre a porta, disse o rei à mulher da limpeza, e ela perguntou, Toda, ou só um bocadinho. O rei duvidou por um instante, na verdade não gostava muito de se expor aos ares da rua, mas depois reflexionou que pareceria mal, além de ser indigno da sua majestade, falar com um súdito através de uma nesga, como se tivesse medo dele, mormente estando a assistir ao colóquio a mulher da limpeza, que logo iria dizer por aí sabe Deus o quê, De par em par, ordenou. O homem que queria um barco levantou-se do degrau da porta quando começou a ouvir correr os ferrolhos, enrolou a manta e pôs-se à espera. Estes sinais de que finalmente alguém vinha atender, e que portanto a praça não tardaria a ficar desocupada, fizeram aproximar-se da porta uns quantos aspirantes à liberalidade do trono que por ali andavam, prontos a assaltar o lugar mal ele vagasse. O inopinado aparecimento do rei (nunca uma tal coisa havia sucedido desde que ele andava de coroa na cabeça) causou uma surpresa desmedida, não só aos ditos candidatos mas também à vizinhança que, atraída pelo repentino alvoroço, assomara às janelas das casas, no outro lado da rua. A única pessoa que não se surpreendeu por aí além foi o homem que tinha vindo pedir um barco. Calculara ele, e acertara na previsão, que o rei, mesmo que demorasse três dias, haveria de sentir-se curioso de ver a cara de quem, sem mais nem menos, com notável atrevimento, o mandara chamar. Repartido pois entre a curiosidade que não pudera reprimir e o desagrado de ver tanta gente junta, o rei, com o pior dos modos, perguntou três perguntas seguidas, Que é que queres, Por que foi que não disseste logo o que querias, Pensarás tu que eu não tenho mais nada que fazer, mas o homem só respondeu à primeira pergunta, Dá-me um barco, disse. O assombro deixou o rei a tal ponto desconcertado, que a mulher da limpeza se apressou a chegar-lhe uma cadeira de palhinha, a mesma em que ela própria se sentava quando precisava de trabalhar de linha e agulha, pois, além da limpeza, tinha também à sua responsabilidade alguns, trabalhos menores de costura no palácio como passajar as peúgas dos pajens. Mal sentado, porque a cadeira de palhinha era muito mais baixa que o trono, o rei estava a procurar a melhor maneira de acomodar as pernas, ora encolhendo-as ora estendendo-as para os lados, enquanto o homem que queria um barco esperava com paciência a pergunta que se seguiria, E tu para que queres um barco, pode-se saber, foi o que o rei de facto perguntou quando finalmente se deu por instalado, com sofrível comodidade, na cadeira da mulher da limpeza, Para ir à procura da ilha desconhecida, respondeu o homem, Que ilha desconhecida, perguntou o rei disfarçando o riso, como se tivesse na sua frente um louco varrido, dos que têm a mania das navegações, a quem não seria bom contrariar logo de entrada, A ilha desconhecida, repetiu o homem, Disparate, já não há ilhas desconhecidas, Quem foi que te disse, rei, que já não há ilhas desconhecidas, Estão todas nos mapas, Nos mapas só estão as ilhas conhecidas, E que ilha desconhecida é essa de que queres ir à procura, Se eu to pudesse dizer, então não seria desconhecida, A quem ouviste tu falar dela, perguntou o rei, agora mais sério, A ninguém, Nesse caso, por que teimas em dizer que ela existe, Simplesmente porque é impossível que não exista uma ilha desconhecida, E vieste aqui para me pedires um barco, Sim, vim aqui para pedir-te um barco, E tu quem és, para que eu to dê, E tu quem és, para que não mo dês, Sou o rei deste reino, e os barcos do reino pertencem-me todos, Mais lhes pertencerás tu a eles do que eles a ti, Que queres dizer, perguntou o rei, inquieto, Que tu, sem eles, és nada, e que eles, sem ti, poderão sempre navegar, Às minhas ordens, com os meus pilotos e os meus marinheiros, Não te peço marinheiros nem piloto, só te peço um barco, E essa ilha desconhecida, se a encontrares, será para mim, A ti, rei, só te interessam as ilhas conhecidas, Também me interessam as desconhecidas quando deixam de o ser, Talvez esta não se deixe conhecer, Então não te dou o barco, Darás. Ao ouvirem esta palavra, pronunciada com tranquila firmeza, os aspirantes à porta das petições, em quem, minuto após minuto, desde o princípio da conversa, a impaciência vinha crescendo, e mais para se verem livres dele do que por simpatia solidária, resolveram intervir a favor do homem que queria o barco, começando a gritar, Dá-lhe o barco, dá-lhe o barco. O rei abriu a boca para dizer à mulher da limpeza que chamasse a guarda do palácio a vir restabelecer imediatamente a ordem pública e impor a disciplina, mas, nesse momento, as vizinhas que assistiam das janelas juntaram-se ao coro com entusiasmo, gritando como os outros, Dá-lhe o barco, dá-lhe o barco. Perante uma tão iniludível manifestação da vontade popular e preocupado com o que, neste meio tempo, já haveria perdido na porta dos obséquios, o rei levantou a mão direita a impor silêncio e disse, Vou dar-te um barco, mas a tripulação terás de arranjá-la tu, os meus marinheiros são-me precisos para as ilhas conhecidas. Os gritos de aplauso do público não deixaram que se percebesse o agradecimento do homem que viera pedir um barco, aliás o movimento dos lábios tanto teria podido ser Obrigado, meu senhor, como Eu cá me arranjarei, mas o que distintamente se ouviu foi o dito seguinte do rei, Vais à doca, perguntas lá pelo capitão do porto, dizes-lhe que te mandei eu, e ele que te dê o barco, levas o meu cartão. O homem que ia receber um barco leu o cartão de visita, onde dizia Rei por baixo do nome do rei, e eram estas as palavras que ele havia escrito sobre o ombro da mulher da limpeza, Entrega ao portador um barco, não precisa ser grande, mas que navegue bem e seja seguro, não quero ter remorsos na consciência se as coisas lhe correrem mal. Quando o homem levantou a cabeça, supõe-se que desta vez é que iria agradecer a dádiva, já o rei se tinha retirado, só estava a mulher da limpeza a olhar para ele com cara de caso. O homem desceu do degrau da porta, sinal de que os outros candidatos podiam enfim avançar, nem valeria a pena explicar que a confusão foi indescritível, todos a quererem chegar ao sítio em primeiro lugar, mas com tão má sorte que a porta já estava fechada outra vez. A aldraba de bronze tornou a chamar a mulher da limpeza, mas a mulher da limpeza não está, deu a volta e saiu com o balde e a vassoura por outra porta, a das decisões, que é raro ser usada, mas quando o é, é. Agora sim, agora pode-se compreender o porquê da cara de caso com que a mulher da limpeza havia estado a olhar, foi esse o preciso momento em que ela resolveu ir atrás do homem quando ele se dirigisse ao porto a tomar conta do barco. Pensou ela que já bastava de uma vida a limpar e a lavar palácios, que tinha chegado a hora de mudar de ofício, que lavar e limpar barcos é que era a sua vocação verdadeira, no mar, ao menos, a água nunca lhe faltaria. O homem nem sonha que, não tendo ainda sequer começado a recrutar os tripulantes, já leva atrás de si a futura encarregada das baldeações e outros asseios, também é deste modo que o destino costuma comportar-se connosco, já está mesmo atrás de nós, já estendeu a mão para tocar-nos o ombro, e nós ainda vamos a murmurar, Acabou-se, não há mais que ver, é tudo igual.

Andando, andando, o homem chegou ao porto, foi à doca, perguntou pelo capitão, e enquanto ele não chegava deitou-se a adivinhar qual seria, de quantos barcos ali estavam, o que iria ser o seu, grande já se sabia que não, o cartão de visita do rei era muito claro neste ponto, por conseguinte ficavam de fora os paquetes, os cargueiros e os navios de guerra, tão-pouco poderia ser ele tão pequeno que resistisse mal às forças do vento e aos rigores do mar, o rei também havia sido categórico neste ponto, Que navegue bem e seja seguro, foram estas as suas formais palavras, assim implicitamente excluindo os botes, as faluas e os escaleres, os quais, sendo bons navegantes, e seguros, conforme a condição de cada qual, não tinham nascido para sulcar os oceanos, que é onde se encontram as ilhas desconhecidas. Um pouco afastada dali, escondida por trás de uns bidões, a mulher da limpeza correu os olhos pelos barcos atracados, Para o meu gosto, aquele, pensou, porém a sua opinião não contava, nem sequer havia sido ainda contratada, vamos ouvir antes o que dirá o capitão do porto. O capitão veio, leu o cartão, mirou o homem de alto a baixo, e fez a pergunta que o rei se tinha esquecido de fazer, Sabes navegar, tens carta de navegação, ao que o homem respondeu, Aprenderei no mar. O capitão disse, Não to aconselharia, capitão sou eu, e não me atrevo com qualquer barco, Dá-me então um com que possa atrever-me eu, não, um desses não, dá-me antes um barco que eu respeite e que possa respeitar-me a mim, Essa linguagem é de marinheiro, mas tu não és marinheiro, Se tenho a linguagem, é como se o fosse. O capitão tornou a ler o cartão do rei, depois perguntou, Poderás dizer-me para que queres o barco, Para ir à procura da ilha desconhecida, Já não há ilhas desconhecidas, O mesmo me disse o rei, O que ele sabe de ilhas, aprendeu-o comigo, É estranho que tu, sendo homem do mar, me digas isso, que já não há ilhas desconhecidas, homem da terra sou eu, e não ignoro que todas as ilhas, mesmo as conhecidas, são desconhecidas enquanto não desembarcarmos nelas, Mas tu, se bem entendi, vais à procura de uma onde nunca ninguém tenha desembarcado, Sabê-lo-ei quando lá chegar, Se chegares, Sim, às vezes naufraga-se pelo caminho, mas, se tal me viesse a acontecer, deverias escrever nos anais do porto que o ponto a que cheguei foi esse, Queres dizer que chegar, sempre se chega, Não serias quem és se não o soubesses já. O capitão do porto disse, Vou dar-te a embarcação que te convém, Qual é ela, É um barco com muita experiência, ainda do tempo em que toda a gente andava à procura de ilhas desconhecidas, Qual é ele, Julgo até que encontrou algumas, Qual, Aquele. Assim que a mulher da limpeza percebeu para onde o capitão apontava, saiu a correr de detrás dos bidões e gritou, É o meu barco, é o meu barco, há que perdoar-lhe a insólita reivindicação de propriedade, a todos os títulos abusiva, o barco era aquele de que ela tinha gostado, simplesmente. Parece uma caravela, disse o homem, Mais ou menos, concordou o capitão, no princípio era uma caravela, depois passou por arranjos e adaptações que a modificaram um bocado, Mas continua a ser uma caravela, Sim, no conjunto conserva o antigo ar, E tem mastros e velas, Quando se vai procurar ilhas desconhecidas, é o mais recomendável. A mulher da limpeza não se conteve, Para mim não quero outro, Quem és tu, perguntou o homem, Não te lembras de mim, Não tenho idéia, Sou a mulher da limpeza, Qual limpeza, A do palácio do rei, A que abria a porta das petições, Não havia outra, E por que não estás tu no palácio do rei a limpar e a abrir portas, Porque as portas que eu realmente queria já foram abertas e porque de hoje em diante só limparei barcos, Então estás decidida a ir comigo procurar a ilha desconhecida, Saí do palácio pela porta das decisões, Sendo assim, vai para a caravela, vê como está aquilo, depois do tempo que passou deve precisar de uma boa lavagem, e tem cuidado com as gaivotas, que não são de fiar, Não queres vir comigo conhecer o teu barco por dentro, Tu disseste que era teu, Desculpa, foi só porque gostei dele, Gostar é provavelmente a melhor maneira de ter, ter deve ser a pior maneira de gostar. O capitão do porto interrompeu a conversa, Tenho de entregar as chaves ao dono do barco, a um ou a outro, resolvam-se, a mim tanto se me dá, Os barcos têm chave, perguntou o homem, Para entrar, não, mas lá estão as arrecadações e os paióis, e a escrivaninha do comandante com o diário de bordo, Ela que se encarregue de tudo, eu vou recrutar a tripulação, disse o homem, e afastou-se.

A mulher da limpeza foi ao escritório do capitão para recolher as chaves, depois entrou no barco, duas coisas lhe valeram aí, a vassoura do palácio e a prevenção contra as gaivotas, ainda não tinha acabado de atravessar a prancha que ligava a amurada ao cais e já as malvadas estavam a precipitar-se sobre ela aos guinchos, furiosas, de goela aberta, como se ali mesmo a quisessem devorar. Não sabiam com quem se metiam. A mulher da limpeza pousou o balde, meteu as chaves no seio, firmou bem os pés na prancha, e, redemoinhando a vassoura como se fosse um espadão dos tempos antigos, fez debandar o bando assassino. Foi só quando entrou no barco que compreendeu a ira das gaivotas, havia ninhos por toda a parte, muitos deles abandonados, outros ainda com ovos, e uns poucos com gaivotinhos de bico aberto, à espera da comida, Pois sim, mas o melhor é mudarem-se daqui, um barco que vai procurar a ilha desconhecida não pode ter este aspecto, como se fosse um galinheiro, disse. Atirou para a água os ninhos vazios, quanto aos outros deixou-os ficar, até ver. Depois arregaçou as mangas e pôs-se a lavar a coberta. Quando acabou a dura tarefa, foi abrir o paiol das velas e procedeu a um exame minucioso do estado das costuras, depois de tanto tempo sem irem ao mar e sem terem de suportar os esticões saudáveis do vento. As velas são os músculos do barco, basta ver como incham quando se esforçam, mas, e isso mesmo sucede aos músculos, se não se lhes dá uso regularmente, abrandam, amolecem, perdem nervo, E as costuras são como os nervos das velas, pensou a mulher da limpeza, contente por estar a aprender tão depressa a arte de marinharia. Achou esgarçadas algumas bainhas, mas contentou-se com assinalá-las, uma vez que para este trabalho não podiam servir a linha e a agulha com que passajava as peúgas dos pajens antigamente, quer dizer, ainda ontem. Quanto aos outros paióis, viu logo que estavam vazios. Que o da pólvora estivesse desmunido, salvo uns pozinhos negros no fundo, que primeiro mais lhe pareceram caganitas de rato, não lhe importou nada, de facto não está escrito em nenhuma lei, pelo menos até onde a sabedoria duma mulher da limpeza é capaz de alcançar, que ir em busca duma ilha desconhecida tenha de ser forçosamente uma empresa de guerra. Já a ralou, e muito, a falta absoluta de munições de boca no paiol respectivo, não por si própria, que estava mais do que acostumada ao mau passadio do palácio, mas por causa do homem a quem deram este barco, não tarda que o sol se ponha, e ele a aparecer-me aí a clamar que tem fome, que é o dito de todos os homens mal entram em casa, como se só eles é que tivessem estômago e sofressem da necessidade de o encher, E se já traz marinheiros para a tripulação, que são uns ogres a comer, então é que não sei como nos iremos governar, disse a mulher da limpeza.

Não valia a pena ter-se preocupado tanto. O sol havia acabado de sumir-se no oceano quando o homem que tinha um barco surgiu no extremo do cais. Trazia um embrulho na mão, porém vinha sozinho e cabisbaixo. A mulher da limpeza foi esperá-lo à prancha, mas antes que ela abrisse a boca para se inteirar de como lhe tinha corrido o resto do dia, ele disse, Está descansada, trago aqui comida para os dois, E os marinheiros, perguntou ela, Não veio nenhum, como podes ver, Mas deixaste-os apalavrados, ao menos, tornou ela a perguntar, Disseram-me que já não há ilhas desconhecidas, e que, mesmo que as houvesse, não iriam eles tirar-se do sossego dos seus lares e da boa vida dos barcos de carreira para se meterem em aventuras oceânicas, à procura de um impossível, como se ainda estivéssemos no tempo do mar tenebroso, E tu, que lhes respondeste, Que o mar é sempre tenebroso, E não lhes falaste da ilha desconhecida, Como poderia falar-lhes eu duma ilha desconhecida, se não a conheço, Mas tens a certeza de que ela existe, Tanta como a de ser tenebroso o mar, Neste momento, visto daqui, com aquela água cor de jade e o céu como um incêndio, de tenebroso não lhe encontro nada, É uma ilusão tua, também as ilhas às vezes parece que flutuam sobre as águas, e não é verdade, Que pensas fazer, se te falta a tripulação, Ainda não sei, Podíamos ficar a viver aqui, eu oferecia-me para lavar os barcos que vêm à doca, e tu, E eu, Tens com certeza um mester, um ofício, uma profissão, como agora se diz, Tenho, tive, terei se for preciso, mas quero encontrar a ilha desconhecida, quero saber quem sou eu quando nela estiver, Não o sabes, Se não sais de ti, não chegas a saber quem és, O filósofo do rei, quando não tinha que fazer, ia sentar-se ao pé de mim, a ver-me passajar as peúgas dos pajens, e às vezes dava-lhe para filosofar, dizia que todo o homem é uma ilha, eu, como aquilo não era comigo, visto que sou mulher, não lhe dava importância, tu que achas, Que é necessário sair da ilha para ver a ilha, que não nos vemos se não nos saímos de nós, Se não saímos de nós próprios, queres tu dizer, Não é a mesma coisa. O incêndio do céu ia esmorecendo, a água arroxeou-se de repente, agora nem a mulher da limpeza duvidaria de que o mar é mesmo tenebroso, pelo menos a certas horas. Disse o homem, Deixemos as filosofias para o filósofo do rei, que para isso é que lhe pagam, agora vamos nós comer, mas a mulher não esteve de acordo, Primeiro, tens de ver o teu barco, só o conheces por fora, Que tal o encontraste, Há algumas bainhas das velas que estão a precisar de reforço, Desceste ao porão, encontraste água aberta, No fundo vê-se alguma, de mistura com o lastro, mas isso parece que é próprio, faz bem ao barco, Como foi que aprendeste essas coisas, Assim, Assim como, Como tu, quando disseste ao capitão do porto que aprenderias a navegar no mar, Ainda não estamos no mar, Mas já estamos na água, Sempre tive a idéia de que para a navegação só há dois mestres verdadeiros, um que é o mar, o outro que é o barco, E o céu, estás a esquecer-te do céu, Sim, claro, o céu, Os ventos, As nuvens, O céu, Sim, o céu.

Em menos de um quarto de hora tinham acabado a volta pelo barco, uma caravela, mesmo transformada, não dá para grandes passeios. É bonita, disse o homem, mas se eu não conseguir arranjar tripulantes suficientes para a manobra, terei de ir dizer ao rei que já não a quero, Perdes o ânimo logo à primeira contrariedade, A primeira contrariedade foi estar à espera do rei três dias, e não desisti, Se não encontrares marinheiros que queiram vir, cá nos arranjaremos os dois, Estás doida, duas pessoas sozinhas não seriam capazes de governar um barco destes, eu teria de estar sempre ao leme, e tu, nem vale a pena estar a explicar-te, é uma loucura, Depois veremos, agora vamos mas é comer. Subiram para o castelo de popa, o homem ainda a protestar contra o que chamara loucura, e, ali, a mulher da limpeza abriu o farnel que ele tinha trazido, um pão, queijo duro, de cabra, azeitonas, uma garrafa de vinho. A lua já estava meio palmo sobre o mar, as sombras da verga e do mastro grande vieram deitar-se-lhes aos pés. É realmente bonita a nossa caravela, disse a mulher, e emendou logo, A tua, a tua caravela, Desconfio que não o será por muito tempo, Navegues ou não navegues com ela, é tua, deu-ta o rei, Pedi-lha para ir procurar uma ilha desconhecida, Mas estas coisas não se fazem do pé para a mão, levam o seu tempo, já o meu avô dizia que quem vai ao mar avia-se em terra, e mais não era ele marinheiro, Sem tripulantes não poderemos navegar, Já o tinhas dito, E há que abastecer o barco das mil coisas necessárias a uma viagem como esta, que não se sabe aonde nos levará, Evidentemente, e depois teremos de esperar que seja a boa estação, e sair com a boa maré, e vir gente ao cais a desejar-nos boa viagem, Estás a rir-te de mim, Nunca me riria de quem me fez sair pela porta das decisões, Desculpa-me, E não tornarei a passar por ela, suceda o que suceder. O luar iluminava em cheio a cara da mulher da limpeza, É bonita, realmente é bonita, pensou o homem, que desta vez não estava a referir-se à caravela. A mulher, essa, não pensou nada, devia ter pensado tudo durante aqueles três dias, quando entreabria de vez em quando a porta para ver se aquele ainda continuava lá fora, à espera. Não sobrou migalha de pão ou de queijo, nem gota de vinho, os caroços das azeitonas foram atirados para a água, o chão está tão limpo como ficara quando a mulher da limpeza lhe passou por cima o último esfregão. A sereia de um paquete que saía para o mar soltou um ronco potente, como deviam ter sido os do leviatã, e a mulher disse, Quando for a nossa vez faremos menos barulho. Apesar de estarem no interior da doca, a água ondulou um pouco à passagem do paquete, e o homem disse, Mas baloiçaremos muito mais. Riram os dois, depois ficaram calados, passado um bocado um deles opinou que o melhor seria irem dormir, Não é que eu tenha muito sono, e o outro concordou, Nem eu, depois calaram-se outra vez, a lua subiu e continuou a subir, em certa altura a mulher disse, Há beliches lá em baixo, o homem disse, Sim, e foi então que se levantaram, que desceram à coberta, aí a mulher disse, Até amanhã, eu vou para este lado, e o homem respondeu, E eu vou para este, até amanhã, não disseram bombordo nem estibordo, decerto por estarem ainda a praticar na arte. A mulher voltou atrás, Tinha-me esquecido, tirou do bolso do avental dois cotos de vela, Encontrei-os quando andava a limpar, o que não tenho é fósforos, Eu tenho, disse o homem. Ela segurou as velas, uma em cada mão, ele acendeu um fósforo, depois, abrigando a chama sob a cúpula dos dedos curvados, levou-a com todo o cuidado aos velhos pavios, a luz pegou, cresceu lentamente como faz o luar, banhou a cara da mulher da limpeza, nem seria preciso dizer o que ele pensou, É bonita, mas o que ela pensou, sim, Vê-se bem que só tem olhos para a ilha desconhecida, aqui está como as pessoas se enganam nos sentidos do olhar, sobretudo ao princípio. Ela entregou-lhe uma vela, disse, Até amanhã, dorme bem, ele quis dizer o mesmo doutra maneira, Que tenhas sonhos felizes, foi a frase que lhe saiu, daqui a pouco, quando lá estiver em baixo, deitado no seu beliche, vir-lhe-ão à ideia outras frases, mais espirituosas, sobretudo mais insinuantes, como se espera que sejam as de um homem quando está a sós com uma mulher. Perguntava-se se já dormiria, se teria tardado a entrar no sono, depois imaginou que andava à procura dela e não a encontrava em nenhum sítio, que estavam perdidos os dois num barco enorme, o sonho é um prestidigitador hábil, muda as proporções das coisas e as suas distâncias, separa ás pessoas, e elas estão juntas, reúne-as, e quase não se vêem uma à outra, a mulher dorme a poucos metros e ele não soube como alcançá-la, quando é tão fácil ir de bombordo a estibordo.

Tinha-lhe desejado felizes sonhos, mas foi ele quem levou toda a noite a sonhar. Sonhou que a sua caravela ia no mar alto, com as três velas triangulares gloriosamente enfunadas, abrindo caminho sobre as ondas, enquanto ele manejava a roda do leme e a tripulação descansava à sombra. Não percebia como podiam ali estar os marinheiros que no porto e na cidade se tinham recusado a embarcar com ele para ir à procura da ilha desconhecida, provavelmente arrependeram-se da grosseira ironia com que o haviam tratado. Via animais espalhados pela coberta, patos, coelhos, galinhas, o habitual da criação doméstica, debicando os grãos de milho ou roendo as folhas de couve que um marinheiro lhes atirava, não se lembrava de quando os tinha trazido para o barco, fosse como fosse era natural que ali estivessem, imaginemos que a ilha desconhecida é, como tantas vezes o foi no passado, uma ilha deserta, o melhor será jogar pelo seguro, todos sabemos que abrir a porta da coelheira e agarrar um coelho pelas orelhas sempre foi mais fácil do que persegui-lo por montes e vales. Do fundo do porão veio agora um coro de relinchos de cavalos, de mugidos de bois, de zurros de asnos, as vozes dos nobres animais necessários para o trabalho pesado, e como foi que vieram eles, como podem estar numa caravela onde a tripulação humana mal cabe, de súbito o vento deu uma guinada, a vela maior bateu e ondulou, por trás dela estava o que antes não se vira, um grupo de mulheres que mesmo sem as contar se adivinha serem tantas quantos os marinheiros, ocupam-se nas suas coisas de mulheres, ainda não chegou o tempo de se ocuparem doutras, está claro que isto só pode ser um sonho, na vida real nunca se viajou assim. O homem do leme buscou com os olhos a mulher da limpeza e não a viu, Talvez esteja no beliche de estibordo, a descansar da lavagem da coberta, pensou, mas foi um pensar fingido, porque ele bem sabe, embora também não saiba como o sabe, que ela à última hora não quis vir, que saltou para o cais, dizendo de lá, Adeus, adeus, já que só tens olhos para a ilha desconhecida, vou-me embora, e não era verdade, agora mesmo andam os olhos dele a procurá-la e não a encontram. Neste momento o céu cobriu-se e começou a chover, e, tendo chovido, principiaram a brotar inúmeras plantas das fileiras de sacos de terra alinhadas ao longo da amurada, não estão ali porque se suspeite que não haja terra bastante na ilha desconhecida, mas porque assim se ganhará tempo, no dia em que lá chegarmos só teremos que transplantar as árvores de fruto, semear os grãos das pequenas searas que vão amadurecer aqui, enfeitar os canteiros com as flores que desabrocharão destes botões. O homem do leme pergunta aos marinheiros que descansam na coberta se avistam alguma ilha desabitada, e eles respondem que não vêem nem de umas nem das outras, mas que estão a pensar em desembarcar na primeira terra povoada que lhes apareça, desde que haja lá um porto onde fundear, uma taberna onde beber e uma cama onde folgar, que aqui não se pode, com toda esta gente junta. E a ilha desconhecida, perguntou o homem do leme, A ilha desconhecida é coisa que não existe, não passa duma ideia da tua cabeça, os geógrafos do rei foram ver nos mapas e declararam que ilhas por conhecer é coisa que se acabou desde há muito tempo, Devíeis ter ficado na cidade, em lugar de vir atrapalhar-me a navegação, Andávamos à procura de um sítio melhor para viver e resolvemos aproveitar a tua viagem, Não sois marinheiros, Nunca o fomos, Sozinho, não serei capaz de governar o barco, Pensasses nisso antes de ir pedi-lo ao rei, o mar não ensina a navegar. Então o homem do leme viu uma terra ao longe e quis passar adiante, fazer de conta que ela era a miragem de uma outra terra, uma imagem que tivesse vindo do outro lado do mundo pelo espaço, mas os homens que nunca haviam sido marinheiros protestaram, disseram que ali mesmo é que queriam desembarcar, Esta é uma ilha do mapa, gritaram, matar-te-emos se não nos levares lá. Então, por si mesma, a caravela virou a proa em direcção à terra, entrou no porto e foi encostar à muralha da doca, Podeis ir-vos, disse o homem do leme, acto contínuo saíram em correnteza, primeiro as mulheres, depois os homens, mas não foram sozinhos, levaram com eles os patos, os coelhos e as galinhas, levaram os bois, os burros e os cavalos, e até as gaivotas, uma após outra, levantaram voo e se foram do barco transportando no bico os seus gaivotinhos, proeza que não tinha sido cometida antes, mas há sempre uma vez. O homem do leme assistiu à debandada em silêncio, não fez nada para reter os que o abandonavam, ao menos tinham-no deixado com as árvores, os trigos e as flores, com as trepadeiras que se enrolavam nos mastros e pendiam da amurada como festões. Por causa do atropelo da saída haviam-se rompido e derramado os sacos de terra, de modo que a coberta era toda ela como um campo lavrado e semeado, só falta que venha um pouco mais de chuva para que seja um bom ano agrícola. Desde que a viagem à ilha desconhecida começou que não se vê o homem do leme comer, deve ser porque está a sonhar, apenas a sonhar, e se no sonho lhe apetecesse um pedaço de pão ou uma maçã, seria um puro invento, nada mais. As raízes das árvores já estão penetrando no cavername, não tarda que estas velas içadas deixem de ser precisas, bastará que o vento sopre nas copas e vá encaminhando a caravela ao seu destino. É uma floresta que navega e se balanceia sobre as ondas, uma floresta onde, sem saber-se como, começaram a cantar pássaros, deviam estar escondidos por aí e de repente decidiram sair à luz, talvez porque a seara já esteja madura e é preciso ceifá-la. Então o homem trancou a roda do leme e desceu ao campo com a foice na mão, e foi quando tinha cortado as primeiras espigas que viu uma sombra ao lado da sua sombra. Acordou abraçado à mulher da limpeza, e ela a ele, confundidos os corpos, confundidos os beliches, que não se sabe se este é o de bombordo ou o de estibordo. Depois, mal o sol acabou de nascer, o homem e a mulher foram pintar na proa do barco, de um lado e do outro, em letras brancas, o nome que ainda faltava dar à caravela. Pela hora do meio-dia, com a maré, A Ilha Desconhecida fez-se enfim ao mar, à procura de si mesma.


Abraço literário a todos,
Marcos.




EXCELÊNCIA VERSUS IDEOLOGIA

Sou um simples alguém, porém, quanto conservadorismo verborrágico tenho de ler no jornal "O Estado de São Paulo"... eu SE divirto, rs...

Excelência versus ideologia por Carlos Alberto Di Franco

Surpreendente. Assim pode ser definido o resultado das recentes eleições para o Diretório Central de Estudantes (DCE) da Universidade de Brasília (UnB). Pela primeira vez desde o fim da ditadura militar, uma chapa apartidária, e não ideológica, assume a representação estudantil naquela instituição.
Tradicionalmente ocupado pela esquerda, a perda do comando do DCE da Universidade de Brasília pode indicar uma mudança mais profunda. Uma nova geração de estudantes, menos comprometida com o radicalismo ideológico e mais focada na excelência acadêmica e profissional, está mostrando a sua cara. Os integrantes da nova diretoria são alunos dos cursos de Direito, Economia, Administração e Engenharia.
A proposta dos estudantes - que mobilizou lideranças, atraiu votos e desembocou na vitória - representa uma ruptura com o velho discurso salvacionista de certos setores da esquerda. Tachados de direitistas e conservadores, estratégia recorrente e ultrapassada de desqualificação dos adversários, os vencedores não responderam com clichês vazios, mas com conceitos e argumentos racionais. Defendem melhorias concretas na estrutura da universidade. Não estão preocupados com a reforma agrária, com o "capitalismo selvagem" ou com a defesa de Fidel Castro e de Hugo Chávez. Defendem um ideário de interesse dos estudantes: incentivo a parcerias com fundações privadas, melhoria na qualidade do ensino, melhor desempenho acadêmico.
Segundo Mateus Lôbo, aluno de Ciência Política e vice-presidente da chapa vencedora, a Aliança pela Liberdade "é um grupo de alunos que acreditam na excelência e no mérito como forma de se fazer revolução". A afirmação, carregada de sadio inconformismo, consta de matéria veiculada pela UnB Agência.
A nova liderança estudantil defende o pluralismo e o debate das ideias. "O pensamento divergente é saudável no ambiente universitário e isso se provou nas urnas. As pessoas querem um discurso diverso, não um local onde se pregue apenas uma corrente de pensamento", sublinhou Lôbo.
A abertura ao diálogo é uma excelente notícia e está intimamente relacionada com o papel da universidade. O discurso único não condiz com o ambiente acadêmico e não contribui para o desenvolvimento de uma democracia sustentada.
Algo novo, e muito promissor, aparece no horizonte da juventude brasileira. Juntamente com essa mudança pontual, porém simbólica, assistimos ao crescente protagonismo dos nossos jovens nas passeatas contra a corrupção.
Convocadas pelas redes sociais, manifestações contra a corrupção têm atraído milhares de pessoas, sobretudo jovens, em várias cidades do País, como Brasília, São Paulo, Porto Alegre, Belo Horizonte e Rio de Janeiro. O maior ato foi em Brasília, onde a Marcha Contra a Corrupção reuniu na Esplanada dos Ministérios cerca de 30 mil pessoas, segundo a Polícia Militar, durante o desfile em comemoração ao Dia da Pátria. Os manifestantes apareceram com faixas, cartazes, vassouras representando a faxina na política, nariz de palhaço e roupa preta.
O movimento cobrou punição dos envolvidos no mensalão. A passeata ocorreu uma semana após o congresso do PT deixar claro que não apoia nenhum tipo de faxina anticorrupção no governo e considerar que esses movimentos eram parte de uma "conspiração midiática" e uma forma de promover a "criminalização generalizada" da base aliada ao Palácio do Planalto. Mas os manifestantes deixaram claro que não admitem a interrupção da faxina em nome da governabilidade. O poderoso PMDB e os outros partidos da base aliada sentiram a mordida da cidadania. O jogo começou e ninguém conseguirá pará-lo no apito ou ganhar no tapetão.
Jovens, muitos jovens, exigiram a aplicação imediata da Lei da Ficha Limpa - que depende de julgamentos no Supremo Tribunal Federal. As faixas tinham frases fortes e bem-humoradas. Havia dizeres como "país rico é país sem corrupção" - referência ao slogan do governo federal "país rico é país sem miséria". O povo, mais perspicaz do que se pensa, sabe que a dinheirama da corrupção está na raiz da pobreza dos brasileiros. Verbas públicas, desviadas da saúde, da educação, da agricultura, engordam as contas dos parasitas da República e emagrecem a vida e a esperança dos brasileiros.
Ao contrário do ceticismo da geração dos mais velhos, que acumula excessivas reservas de decepção, a moçada acredita na possibilidade de mudança. Não admite, com razão, que o País, refém de uma resignação equivocada, veja desaparecer no ralo da corrupção nada menos que R$ 85 bilhões, segundo detalhado levantamento feito pela revista Veja. Trata-se, amigo leitor, do balanço contábil da roubalheira, da conta que a sociedade paga pela chamada governança pragmática. O apoio político cobra um pedágio vergonhosamente imoral e criminoso. A corrupção drena anualmente dos cofres públicos o equivalente a 2,3% de toda a riqueza produzida pelo País. É um câncer que vai destruindo o organismo nacional. Se fosse usado para fazer investimentos públicos, esse dinheiro mudaria a cara do Brasil e faria, de fato, a tão almejada justiça social.
Os brasileiros começam a se indignar com a corrupção. E a juventude, idealista por natureza, é a porta-bandeira da cidadania. O recado dos jovens é muito claro e seria bom que os políticos tomassem nota.
A juventude não aceita mais o quadro que está aí. As manifestações de rua, pacíficas e cada vez mais expressivas, desembocarão com força irreprimível nas redes sociais. As próximas eleições reservam desagradáveis surpresas para aqueles que fazem da política a arte do engodo e uma plataforma para ganhar dinheiro fácil.

http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,excelencia--versus-ideologia-,798394,0.htmv acesso em 16/11/2011.

Grande abraço a todos,
Marcos.

MAIS JABORIANAS...

Este texto está entre parêntesis. Isso. Passei as últimas semanas escrevendo sobre memórias de infância, bancando uma espécie de "Proust de classe média" e hoje faço uma pausa para meditação: devo ou não continuar essa viagem 'para dentro'?
Afinal, que tenho para descobrir e revelar senão detritos de lembranças, que talvez não iluminem verdade alguma? Que estranho procedimento - ficar garimpando irrelevâncias do passado em um Brasil tão brutalmente presente, onde tudo grita, onde se exibem 'verdades' escandalosamente paralisadas.
Que vão pensar de mim? Imagino o le itor: "Será que ele está querendo se exibir, bancar o 'culto'? Como ousa querer ser 'artístico', neste mundo digital, em que a superficialidade da criação multidirecional e sem autores virou um cânone estético?".
Fiquei até com sentimento de culpa, pois ousei ser um pobre 'proustiano' em vez de criticar, por exemplo, a carantonha gargalhante de Carlos Lupi, o atual retrato escarrado da desgraça brasileira.
Mas, na vida que levo, comentando política, fiquei ultimamente com desejo de tocar em alguma coisa relevante, alguma coisa que (pareça) 'real' e que (pareça) revelar o mistério inalcançável da existência (oh, esperança inútil...).
Proust viveu uma época conturbada como a nossa: nacionalismos que deram na Primeira Guerra Mundial, o surgimento do antissemitismo que explodiu no caso Dreyfus, a lenta formação de uma tragédia que ia se desencadear no nazismo e suas consequências. Como nós, ele viveu à beira de catástrofes anunciadas - qual serão as nossas?
Então, ele se trancou no quarto e partiu para a epopeia de 'irrelevâncias' que guardassem verdades profundas sobre a sociedade francesa (e humana). No turbilhão de acontecimentos terríveis, ele se refugiou para escrever e salvar-se pela beleza e arte.
Do meu canto, diante de tantas 'certezas' modernas, também quero voltar-me para as 'coisas vagas' de que falava Valéry, as 'coisas ausentes', sem as quais é impossível viver. E as 'coisas vagas' talvez estejam em nossa mínima experiência pessoal.
Contudo, a narrativa subjetivista pode ser uma expressão de banalidade, que só pode ser evitada se problematizarmos a representação do 'eu' e a própria noção de identidade, nos obrigando a retroceder para fora de nossa experiência comum - como escreveu há 6 meses Alcir Pécora, analisando a literatura autocomplacente de hoje e fechando com a sentença fatal: "Atitude resolve o problema do roqueiro, mas não resolve a questão da literatura".
Ou, como prescreve Paulo Henriques Britto num poema excepcional: "No poema moderno, é sempre nítida uma tensão entre a necessidade de exprimir-se uma subjetividade numa personalíssima voz lírica e, de outro lado, a consciência crítica de um sujeito que se inventa e se evade, ao mesmo tempo ressaltando o que há de falso em si próprio - uma postura cínica, talvez, porém honesta, pois de boa-fé o autor desconstrói seu artifício, desmistifica-se para o leitor-irmão".
É isso aí. Tão forte é a 'desumanização' da 'tecnocultura' multidirecional, tão intrincado é o mundo pós-ideológico, que os artistas buscam ínfimas certezas sobre o que nos resta de 'humano'.
O leitor torcerá talvez o nariz, irritado com meu papo meio 'cabeça': "Mas, afinal, qual é essa de fazer como esse tal de Proust, que dizem que era veado?".
Respondo que o tal de Proust encetou uma tarefa de trágica impossibilidade - atingir o 'real'. No entanto, fez uma compilação profunda das minúcias psicológicas da sociedade burguesa e aristocrática, salvou nosso rico delírio inconsciente, salvou nossa humana loucura contra o duro racionalismo que deu na Segunda Guerra. Que imensa coragem! Que solidão! O que fez esse homem ficar à margem da vida, analisando a frágil insanidade que nos define, ele, uma bicha solitária em pleno preconceito dos anos 10, ele, que transformou a própria 'anomalia' em arte total, ele que escreveu uma "Ilíada" interior, existencial, sem fim nem começo, da infância até a morte num trajeto circular e recorrente.
Como Cézanne, igualou os homens à natureza, misturando sujeitos e objetos, examinando em detalhes desde os salões de duques e príncipes até irisados matizes de uma corola, desde o brilho das flores nos bosques até o tremor dos cílios da vaidade, dos lábios vorazes da glória mundana até a dentadura brutal do rancor - o esgar da inveja, o desespero da solidão sexual nos bordeis de sadomasoquistas, a crueldade dos amores, o ciúme como tortura desejada, tudo em uma sociedade se contorcendo sob a luz negra da Primeira Guerra, Paris em pânico, com viciados sodomizando-se no breu dos túneis do metrô, sob as bombas dos aviões alemães, a bravura sem prêmio de soldados, a covardia de duques arrogantes, o horror do caso Dreyfus, dividindo a sociedade em antissemitas e tolerantes. Ele analisava o ridículo com compaixão e sem se excluir, ele, que tudo via com a mente implacável de um Homero das irrelevâncias, mas também com o olho feminino e atento tanto para o vermelho Carpaccio das sedas da duquesa de Guermantes como para o azul Veronese de um robe de Fortuny.
Proust fez a geometria das emoções, descrevendo ciúmes, amores, inveja, hipocrisia, com a nitidez de um teorema, com a limpidez de um mapa de geógrafo. Irritava-se quando diziam que ele era um microscópio dos detalhes, pois, ao contrário, queria descobrir leis, regras fixas que resumissem a estrutura dos comportamentos.
E fez isso imolando a vida à arte, querendo deixar algum vestígio no Tempo, pensando não em leitores que o aprovassem mas, generosamente, em criar "leitores de si mesmos" (como ele escreveu).
Esta é a sensação de vazio que me toma ao ver o mundo tão cheio de acontecimentos bombásticos, mas cada vez mais longe do 'humano' originário.
Daí, meu desejo de virar-me para dentro, para saber: o que sobrou de mim?
Continuarei esta viagem interior, esta minissérie sobre mim mesmo? Não sei. Aguardem os próximos capítulos. Ou não...

http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,eu-entre-parentesis--,798759,0.htm acesso em 16/11/2011.

A democracia e as desigualdades sob o ponto de vista americano

Um mapa das assimetrias que são socialmente aceitáveis nos Estados Unidos

Quarta, 15 de Novembro de 2011, 03h05
 
É COLUNISTA, DAVID, BROOKS, THE NEW YORK TIMES, É COLUNISTA, DAVID, BROOKS, THE NEW YORK TIMES

Turistas estrangeiros têm me questionado nas ruas. "David, diante de tantas desigualdade nos EUA, quais são as socialmente aceitáveis?" É uma ótima pergunta. Apresento aqui um mapa da desigualdade americana para evitar constrangimentos.
A desigualdade acadêmica é socialmente aceitável. Não há problema quando demonstramos fazer parte do 1% que frequenta as melhores universidades ao usar agasalhos de Princeton, Harvard ou Stanford.
Já a desigualdade de origens ancestrais não é socialmente aceitável. Não se pode andar por aí se gabando de ser de uma família que desembarcou do Mayflower nem dizer que descende de gerações de Throgmorton-Winthrops, que transmitiram um legado de educação elitista e boas maneiras.
A desigualdade de preparo físico é aceitável. Não há problema em vestir uma lycra justa para mostrar ao mundo que a prática de pilates lhe deu coxas de aço. Exibições desse tipo são bem-vindas enquanto prova de sua louvável disciplina e mérito.
A desigualdade de preparo moral é inaceitável. É contra as regras vangloriar-se de superioridade na castidade, na integridade, na honra ou na honestidade. Em vez disso, deve-se respeitar o fato de que somos todos moralmente iguais, por mais que variem nossos comportamentos e gostos éticos.
A desigualdade esportiva é aceitável. É normal usar uma camisa dos Yankees, um agasalho da LSU ou os variados emblemas das equipes esportivas profissionais. O fato de o seu time ter o hábito de arrasar os adversários é representativo da sua força enquanto indivíduo.
A desigualdade entre as crenças é inaceitável. Não seria correto usar uma camiseta católica, batista ou judaica para sugerir que seus correligionários estariam mais próximos de Deus. É errado desmerecer religiões com base na ideia de que o credo dos outros é equivocado.
A desigualdade de renda é aceitável. No caso de um grande craque do beisebol, é socialmente aceitável que os seus serviços sejam vendidos por US$ 25 milhões por ano (afinal, é preciso fazer aquilo que é melhor para a sua família). No caso de um executivo destacado, não é mais considerado de bom tom receber um pacote de compensação de US$ 18 milhões, mas todos aqueles que ainda conseguem algo do tipo aceitam a oferta.
A desigualdade de gastos é menos aceitável. Para aqueles que ganham US$ 1 bilhão, é recomendado ir para o trabalho de calça jeans e camiseta preta. É recomendado morar em Omaha e comer em restaurantes simples.
Para os que ganham US$ 200 mil por ano, é aceitável gastar dinheiro em qualquer cômodo antes usados por empregados, como a cozinha, mas é vulgar gastá-lo com brinquedos adultos que poderiam proporcionar prazeres superficiais, como uma Maserati.
A desigualdade tecnológica é aceitável. Se você é do tipo de pessoa que compreende os últimos lançamentos de hardware e os mais novos avanços do software, que conhece os melhores aplicativos, é aceitável demonstrar com orgulho o seu conhecimento superior e exibir-se diante dos ultrapassados que não entendem nada.
A desigualdade cultural é inaceitável. Aqueles que vão à ópera ou apreciam peças de Ibsen não podem acreditar que são donos de uma sensibilidade mais refinada do que as pessoas que gostam de Lady Gaga, Ke$ha e grafite.
A desigualdade de status é aceitável para os professores universitários. As universidades existem dentro de uma estrutura de status cuidadosamente estratificada e certas universidades, como Brown, contam com uma verdadeira elite discente. Os departamentos universitários são comparados em rankings e concorrem pela superioridade.
A desigualdade de status é inaceitável para os professores do ensino médio. Os professores dessa categoria resistem às comparações em rankings. Seria desprezível que o departamento de uma escola concorresse com os departamentos de outras escolas próximas.
A desigualdade entre as cervejas está em queda.
Antes, havia uma grande diferença de status entre as cervejas menores e a boa e velha Budweiser. No jargão acadêmico, as cervejas tinham um alto coeficiente de Gini. Mas, conforme as microcervejarias se adaptaram ao grande mercado, essas diferenças diminuíram.
A desigualdade entre os cupcakes está em alta. Os fregueses ficam horas na fila de lojas especializadas, por mais que haja outros bons cupcakes à venda na loja da Safeway mais próxima, sem fila nem nada.
A desigualdade em viagens é aceitável. É normal que haja filas específicas de check-in para os passageiros que acumularam bônus em programas de milhagem. A desigualdade no supermercado é inaceitável. Não seria permitido que houvesse uma fila especial para um caixa dedicado aos consumidores obesos que gastam muito em porcarias e guloseimas.
A desigualdade esportiva é inaceitável se o seu filho ou filha for um atleta mediano na equipe juvenil da qual participa.
Mas, se estivermos falando de um astro, os grandiosos feitos dele ou dela serão a justificativa de toda a sua existência.
A desigualdade entre as vocações é aceitável desde que não seja comentada. Os cirurgiões são mais prestigiados do que os motoristas de estacionamento, mas isto não é oficialmente reconhecido.
Por outro lado, a desigualdade étnica - acreditar que um grupo é melhor do que o outro - é inaceitável (esse é um dos maiores feitos da nossa cultura).
Caro visitante, somos um povo democrático e igualitário, que passa a vida tentando desesperadamente superar um ao outro. Desejamos a todos uma estadia agradável.
TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

http://m.estadao.com.br/noticias/impresso,a-democracia-e-as-desigualdades-sob-o-ponto-de-vista-americano,798718.htm acesso em 16/11/2011.

Abraço a todos,
Marcos.